segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

La Cittá Civilittá parte IV - "Il Amico"



Um grito, na verdade queria ser uma cantoria...

Conhecia aquela música, um sujeito de barba fechada e grossa destoava una vera tarantela calabresa (mas às 7:00?)...
Qualquer italiano que se prese, vindo desde Luca até a Sícilia, toma logo conhecimento, mesmo com uns vinhos na cabeça, que a tarantela não se canta logo cedo assim. Aquele baita maschio, sua vestimenta denunciava-se perante o meu desmerecido abito. Logo ele havia atravessado a rua dançando com um garrafão de vinho na mão, seu Elias gritava: "má non vai quebrá é", parecia ele mesmo um italiano também. Foi o primeiro momento em que me senti em casa, o ambiente antes carregado logo se tornava mais agradável, (apesar de o cheiro ser o mesmo) as pessoas sorriam e logo eu me recordava da minha infância quando ainda bambino ia com papa até a adega duma das ruelas de Napoli e colocava minha mãozinhas (manozinas) no balcão para ver o papagaio (Paco) do dono da venda, de repente após beber um copo de vinho papai já mudava e me respondia com um tapa...

Logo meu pensamento foi interrompido por um bater nas costas, enquanto cantava nosso tenor eu seria servido pelo mesmo do mais caro vinho daquela orrenda bodega... Pela primeira vez, em uma semana que estava naquela cidade, eu sentia a mão de um amigo batendo forte nas minhas costas (é, ele parecia estar muito bêbado e não ter noção da força). Percebi então, como a linguagem da música era simbólica, enquanto ele declamava uma antiga música que ele dizia italiana. Uma ópera, o enredo falava de um palhaço humilhado pelo seu público num circo, o tom melancólico descrevia cena por cena de uma peça onde da angústia do personagem principal ele passa para a malvadez criada entre os seus sentimentos. Sua reação foi roubar todo dinheiro do proprietário da caravana e queimar a lona do circo enquanto todo o povo de uma cidade assistia o espetáculo do trapezista. A história se passava num vilarejo na antiga Transilvânia. Aquela vingança representava não somente o ódio, mas também a forma como alguns seres se aproveitam da ignorância alheia. Isso tudo ele, o tenor, havia me explicado logo depois, pois de sua pronúncia era difícil extrair alguma coisa de italiano, eu não entendia nada:

(...)
"Tu soi palaccio,
tu soi ridi per te,
tua vita é questa
un palaccio
(...)

Impossível compreender somente pela música.
Saímos juntos do Marieta, ele marcou nossa despesa numa conta (já devia mesmo dois meses de salário lá). Um homem de 30 e poucos, solteiro. Perguntou meu nome e o que fazia ali, tão logo respondi em tom mais elevado que da primeira vez e contando que estava procurando emprego e uno moradia, uno aparttamento.

Eu desconhecia o motivo, mas aquele personagem típico me parecia próximo, como algo que eu procurava ser, algo dentro de mim. Contava ele que desocuparia um apartamento na semana que vem, ele estava saindo pois nenhum ponta-grosseiro (acho que é assim que se chama o cidadão daqui) queria morar com ele por algum motivo que eu desconhecia. Logo a contemplação do acaso, contei que vinha da Itália, havia passado por Santos e abarcado na cidade princesesca a menos de uma semana. Nos dirigimos ao local onde morava. Sua reação foi totalmente receptiva me chamando de irmão, gritando e cantando uma ópera que eu não compreendia (compreendere) muito bem.

Um comentário:

  1. Ninguém poderia reprovar alguém que faz uma janta desinteressada... A comida gordurosa do bar do Valdeci é mais atrativa para Silveira, nunca para Francesco.

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